Educafro diz que bancos não têm promovido inclusão social em seus quadros

29 de março de 2016

A organização não governamental (ONG) Educafro afirmou na última segunda-feira (28), no Senado Federal, que a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) não tem cumprido com as metas de inclusão social assumidas em 2009, com o objetivo de combater a exclusão institucional de mulheres, negros e deficientes no quadro de funcionários dessas instituições.

Diretor executivo da Educafro, Frei David Santos defende a criação de cotas nessas instituições. Em audiência pública no Senado, Frei David lembrou que a Febraban apresentou, em 2 de julho de 2009, um plano de metas visando ao combate à exclusão institucional de mulheres, negros e deficientes nas instituições bancárias. “No entanto, a situação pouco melhorou desde então”, lamentou.

Segundo Frei David, a Educafro. cuja missão é promover a inclusão da população negra e pobre nas universidades públicas e particulares com bolsa de estudos, tem encontrado dificuldades para obter dados oficiais sobre o perfil do quadro de funcionários dos bancos brasileiros.

O diretor da Educafro considerou “suspeitos” os poucos dados existentes pelo fato de as pesquisas terem sido financiadas pela própria Febraban, por meio do Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades. Por isso, ele sugeriu o compartilhamento de dados para que uma nova pesquisa seja feita por “órgãos mais isentos”.

No entanto, até mesmo a pesquisa encomendada pela Febraban mostra quão pouco as instituições bancárias têm avançado em termos de inclusão social. “Em 2009, 87% do quadro dos bancos era ocupado por brancos e 12% por negros. Em 2014, 82% do quadro era ocupado por brancos, e 16% por negros. Isso mostra que o ritmo apresentado é lento”, disse Frei David.

Ainda segundo os números apresentados pela Educafro, 35,5% dos funcionários dos bancos são indicados por amigos ou parentes. Nos bancos públicos, onde parte dos cargos é ocupada por pessoal concursado, o índice cai para 21,4%. As indicações feitas por funcionários correspondem a 39,2% dos cargos ocupados nas instituições privadas e a 7% nas públicas. “É alta a quantidade de pessoas contratadas pelo banco por indicação de amigos, familiares e funcionários. Cargo ocupado por amigos é das coisas mais cruéis. Há algo de colonialismo nisso. Os bancos são muito avançados em vários aspectos, mas no aspecto da inclusão dos negros, não. Ainda se adotam métodos colonialistas”, reclamou Frei David.

Chefias brancas

Conforme números citados pela Educafro, o percentual de cargos ocupados por negros fica ainda menor quando o recorte abrange os cargos mais altos. “Apesar de os negros representarem 53,7% da população, nos cargos de diretoria ou superintendência das entidades ligadas à Febraban não chegam a 5%. Os brancos ocupam 91,6% desses cargos”, disse ele. “Apenas 14,9% dos cargos de gerência são ocupados por negros, ante os 81,7% ocupados por brancos. No caso dos cargos de supervisão, chefia e coordenação, o percentual de ocupação por negros é 17%, e de 79,8% por brancos”, acrescentou Frei David.

Ele destacou que a Febraban havia assumido também uma forte campanha de conscientização pela inclusão. “No entanto, isso não foi constatado nas visitas feitas a agências bancárias. Sequer havia cartazes fixados abordando o problema. Alguns gerentes sequer tinham visto o cartaz da campanha preparado pela Febraban [e apresentado como material de campanha à Educafro]”.

Discriminação

“Na última audiência, o representante da Febraban [na tentativa de explicar o quadro de servidores dos bancos] disse que alguns gerentes não aceitam funcionários negros. Qual o motivo dessa dificuldade? Quem dá a eles esse poder? O gerente não tem o poder de me emprestar o que quiser porque não deram a ele esse poder. Então por que dão ao gerente o poder de contratar quem ele quiser? São várias coisas mal explicadas. A Febraban tem de se explicar e sair de cima do muro”, cobrou o diretor da Educafro.

Segundo o procurador-chefe da Procuradoria Regional do Trabalho da 10ª Região, Alessandro Santos de Miranda, “todos os dados demonstram existência de discriminação” nas instituições bancárias. “Mulheres, negros e pessoas com deficiência recebem menos e não têm possibilidade de se qualificar porque não são oferecidos curso de qualificação e melhoria para que almejem melhores postos. São problemas históricos que dependem de muita boa vontade de todos os segmentos. Isso tem de ser enfrentado”, disse à Agência Brasil o procurador após participar da audiência pública.

“No passado, ajuizamos ações contra os cinco maiores bancos do país [visando enfrentar esse problema], mas não tivemos apreciação positiva pelo Poder Judiciário. Isso foi há cerca de 12 anos, quando o Judiciário não aceitava provas oficiais como elemento probante para fundamentar uma ação”, disse Miranda, referindo-se a dados oficiais obtidos de instituições como, por exemplo, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

“Apesar de sua relevância, esses dados não se prestavam como prova única para formar a fundamentação dos magistrados que julgaram. Talvez por insegurança, talvez por desconhecimento. Mas de lá para cá, houve o ajuizamento de várias ações denunciando várias formas de descriminação. Com isso, o Judiciário está amadurecendo e aceitando que as provas oficiais têm o valor probante que merece ter”, completou Miranda.

Resposta da Febraban

Contatada pela Agência Brasil, a Febraban informou que alguns dos números divulgados pela Educafro estão incorretos ou apresentam recorte diferente do apresentado nas pesquisas do Centro de Estudos das Relações de Trabalho. De acordo com a Febraban, o percentual de negros no quadro de funcionários dos bancos brasileiros era 19% em 2008, passando a 24,7% em 2014. Esse percentual, segundo a entidade, corresponde àqueles que se “autodefiniram como negros”, em uma “classificação do IBGE que abarca pretos e pardos”.

No que se refere a cargos ocupados a partir da indicação de parentes, amigos ou funcionários, a Febraban apresentou um recorte informando como o funcionário “tomou conhecimento da vaga” por ele ocupada (29% por amigos ou parentes; 22,6% por funcionários do banco), e não retratando aqueles que estão lá em função dessas indicações.

Enquanto Frei David apresentou dados relativos ao percentual de negros que ocupam os principais cargos, tendo como base de comparação o quadro total de servidores, a Febraban adotou como recorte o percentual de negros ocupando os principais cargos, entre os negros contratados. Além disso, a Febraban junta, em um grupo apenas, os cargos de gerência, superintendência e direção. Assim sendo, a participação de negros nesses cargos “é pouco inferior à dos brancos”, estando em 17,1% contra 19,7%.

A Febraban não respondeu a algumas demandas da Agência Brasil, relativas às metas assumidas em 2009 e à não disponibilização de dados solicitados pela Educafro, visando a pesquisas independentes sobre o quadro funcional nas instituições financeiras. Sobre os comentários atribuídos por Frei David a um representante seu na audiência pública anterior – de que alguns gerentes não aceitam funcionários negros – a Febraban informou que não comenta a declaração, uma vez que não obteve, até o momento, informações mais detalhadas sobre a audiência em que isso foi dito e por não saber exatamente qual foi o contexto da afirmação atribuída a seu representante.

FONTE: Pedro Peduzzi / Agência Brasil

FOTO: divulgação / Pedro França – Agência Senado

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