Prestes a ser votada pelo congresso, a Reforma da Previdência, proposta pelo governo federal, tem causado muitas discussões. O aumento da idade mínima e do tempo de contribuição são fatores que afetam praticamente todos os trabalhadores brasileiros. Apesar disso, ainda há muitas dúvidas sobre o que diz o texto da Reforma e como ela realmente pode impactar em nossas vidas.
O Sindicato dos Bancários e Financiários de Novo Hamburgo e Região procurou uma das maiores especialistas do país no assunto para esclarecer a tão debatida Reforma. Conversamos com a Dra. Jane Berrwanger, doutora em direito Previdenciário pela PUC/SP, mestre em Direitos Sociais pela UNISC, palestrante da OAB/RS, presidente do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP) e professor de Direito Previdenciário de diversas instituições em todo País.
Confira a entrevista exclusiva:
SindiBancários – A Reforma da Previdência realmente é necessária?
Dra. Jane – Rediscutir as normas previdenciárias, temporariamente é possível e necessário, no sentido de fazer ajustes e adequações. Por exemplo, a sociedade recebeu bem as mudanças realizadas em 2015, quando a pensão por morte deixou de ser concedida para a vida toda, no caso de viúvos e viúvas jovens. Esse é um exemplo de mudança correta. Da mesma forma, não se justifica pagar pensão para filha solteira de militar. Portanto, é possível e necessário discutir reforma, mas não como está sendo proposto, que é, na verdade, quase uma destruição da Previdência.
SindiBancários – Quais são as mudanças mais impactantes da proposta de Reforma da Previdência na vida dos trabalhadores?
Dra. Jane –
1) Mudança de sistema de repartição (solidariedade, em que todos contribuem para o sistema e retiram benefícios quando preencherem os requisitos) para o sistema de capitalização (em que haverá poupança individual, sem qualquer garantia de remuneração).
b) Retirada das regras previdenciárias da Constituição Federal, passando para lei complementar, facilitando a aprovação, logo em seguida, de novas regras.
c) Aumento da idade da aposentadoria e do benefício assistencial sempre que aumenta a expectativa de sobrevida. Isso é muito ruim, porque fica a impressão de a pessoa estar “correndo atrás” da aposentadoria, sem alcançar nunca.
d) Benefício assistencial de R$ 400,00 para idosos pobres, sem qualquer previsão de reajuste
e) Mudança nos benefícios rurais, com exigência de contribuição direta.
SindiBancários – Como é o cálculo de tempo de contribuição X idade hoje e como deve ficar?
Dra. Jane – Há um forte impacto no valor dos benefícios.
Por exemplo, hoje uma aposentadoria por idade de uma mulher com 20 anos de contribuição é de 90% a média das contribuições. Com a reforma, receberá 60% da média.
SindiBancários – Essas mudanças, por si, são suficientes para equilibrar as contas e ainda garantir a seguridade social aos trabalhadores brasileiros?
Dra. Jane – Se o Governo pelo menos dividisse o foco do ajuste das contas públicas entre o tema da Previdência e o tema da dívida pública, já seria melhor. Hoje, o Governo quer resolver tudo colocando a culpa na Previdência. Isso só vai empobrecer a população e não vai resolver o problema fiscal, porque vai tirar dinheiro de circulação da sociedade para pagar dívida pública.
SindiBancários – Neste formato da proposta da Reforma, qual o perfil do beneficiário que será mais prejudicado? Por quê?
Dra. Jane – Difícil é dizer quem não será prejudicado. Mas, como sempre, os mais pobres serão os mais afetados. Destaco aqui os trabalhadores rurais e os benefícios assistenciais, que são de salário mínimo.
SindiBancários – Um dos pontos que mais gerou debate é o do tempo de contribuição para obter 100% do benefício. Como é feito este cálculo hoje e como deve ser, sendo a proposta da Reforma aprovada?
Dra. Jane – Hoje tem 3 regras:
Aposentadoria por idade: 70% da média + 1% a cada ano de contribuição
Aposentadoria por tempo: média x fator previdenciário – caso some 86 pontos (idade + tempo de contribuição), se mulher e 96 pontos, se homem, não se aplica o fator previdenciário
Aposentadoria especial e aposentadoria da pessoa com deficiência: média das contribuições (sem fator previdenciário).
(quando se fala em média, é sempre média dos 80% maiores salários)
Na Reforma:
Aposentadoria por idade (por tempo de contribuição não vai mais ter): 60% da média + 2% a cada ano além dos 20 anos.
Apenas a pessoa com deficiência teria 100% da média
SindiBancários – Mesmo sabendo que não existe certeza dos resultados da Reforma, existiria uma proposta mais justa, que equilibrasse as contas da Previdência sem que o trabalhador fosse tão afetado?
Dra. Jane – A transição deveria ser mais longa, sem aquela vontade de economizar muito em pouco tempo. Outro ponto importante: a Reforma deveria respeitar as diferenças entre os beneficiários: mulheres, atividade especial, trabalhadores rurais, professores, etc. Cada tipo de trabalho tem as suas especificidades.