“Governo vive de chantagem, não é aceitável. Queremos devolver ao povo o direito de escolher o presidente”, disse o deputado Alessandro Molon (Rede-RJ).
Katia Guimarães Brasil de Fato
Enquanto as manifestações pelas Diretas Já começam a se espalhar pelo país – ocorreram no Rio de Janeiro, São Paulo, Salvador e esta semana será em Belo Horizonte – a oposição enfrenta no Congresso Nacional uma dura batalha contra a base governista na tentativa de fazer avançar a tramitação das Propostas de Emendas Constitucional (PEC) que abrem a possibilidade de eleições diretas caso o presidente golpista, Michel Temer (PMDB), saia do cargo.
Desta vez, o embate foi na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados, onde se tenta colocar em votação a PEC 227/16, do deputado Miro Teixeira (Rede-RJ), que prevê a escolha do presidente da República, em caso de vacância dele e seu vice a qualquer tempo, exceto faltando seis meses para o término do mandato.
Nessa terça-feira (13), depois que a oposição conseguiu pautar o debate da emenda como pauta única da CCJ, a base aliada optou por adotar um mecanismo próprio dos oposicionistas e obstruiu a sessão para impedir até mesmo o debate da matéria.
A obstrução foi anunciada pelo deputado José Carlos Aleluia (DEM-BA) ao afirmar que a base do governo iria se valer do chamado “kit obstrução” para impedir a análise da admissibilidade da PEC das Diretas.
Para prolongar o início do debate, Aleluia apresentou requerimento de inversão de pauta, ou seja, a troca de ordem dos itens da pauta e pediu votação nominal como o primeiro item do “kit obstrução”. No final das contas, a oposição votou favorável ao requerimento do governo na tentativa de manter o quórum enquanto a oposição se declarou em obstrução e não votou.
Parlamentares governistas, contrários à PEC, deixaram de registrar presença durante a votação nominal e o quórum para não foi alcançado. Sem o voto dos governistas, apenas 27 deputados votaram por meio do painel eletrônico – sete a menos do que o exigido pelo Regimento Interno.
Favoráveis à realização de eleições diretas, apenas deputados do PT, PSB, PDT, PCdoB, Psol e Rede registraram seus votos. Apesar da derrota, o presidente da CCJ, Rodrigo Pacheco (PMDB-MG), anunciou que a admissibilidade da PEC deverá ser incluída na pauta de reunião extraordinária na próxima semana, como item único.
Diretas Já
Ao longo do debate, que durou quase três horas, a oposição se revezou no microfone para criticar a postura do governo de evitar o debate sobre a PEC das eleições diretas e acusar o Palácio do Planalto de manipular parlamentares para barrar uma possível votação no plenário da Câmara, caso Temer seja denunciado pela Procuradoria Geral da República (PGR), processo que precisa primeiro passar pela CCJ.
O deputado Alessandro Molon (Rede-RJ), autor do requerimento que garantiu a sessão de hoje, condenou a obstrução do governo: “Isso é muito inusitado, isso mostra que não há nada normal nesse momento no país nesse governo”, reclamou. Para ele, não há motivo para que o debate sobre a emenda não ocorra.
“O governo, que vive de chantagem, isso não é aceitável, queremos devolver ao povo o direito de escolher o novo presidente da República. Espero que o governo tenha o mínimo de decência para enfrentar o tema”, afirmou ao reclamar da obstrução da oposição e da ameaça de dar início às votações no plenário para derrubar a sessão da CCJ.
Ao fazer a defesa da PEC das Diretas, o deputado Wadih Damous (PT-RJ), lembrou o plebiscito realizado em 1963, durante o governo João Goulart, que garantiu a volta do presidencialismo ao país, depois de um curto período de parlamentarismo. “Esse é o imaginário do povo brasileiro, o povo brasileiro é presidencialista e gosta de votar. Entende que o voto é sinônimo de democracia. É uma pena que a maioria se valha do instrumento da minoria para obstruir uma discussão, na verdade estão obstruindo é a democracia”, afirmou.
Admissibilidade
Como relator, o deputado Esperidião Amim (PP-SC) apresentou seu voto pela admissibilidade da PEC e afirmou que a proposta não ofende quaisquer das cláusulas pétreas da Constituição e valoriza um dos princípios do estado democrático de direito, que é a soberania popular. Segundo Amim, a PEC do deputado Miro Teixeira amplia o alcance do voto direto e restringe a aplicação do voto indireto para casos de exceção.
No Senado, a PEC 67/2016, que prevê eleições diretas no caso de vacância do cargo de presidente da República e do vice até o terceiro ano do mandato, já foi aprovada pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) e depende agora da aprovação no plenário do Senado para ser encaminhada para a Câmara dos Deputados.
A oposição quer acelerar a análise da emenda e aguarda que o presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), faça a leitura do texto da PEC para dar início às discussões no plenário. Segundo o regimento, são previstas oito sessões de discussão e dois turnos de votação.
Atualmente, a Constituição prevê eleição direta de presidente e vice-presidente em caso de vacância apenas nos dois primeiros anos do mandato. Nos dois últimos anos, a eleição é indireta, e os nomes são escolhidos em sessão conjunta do Congresso Nacional.
EDIÇÃO: Vanessa Martina Silva