Com desemprego superando a marca de 12 milhões, especialistas explicam que o baixo crescimento do PIB é uma ilusão
Após dois anos de queda, com o país acumulando perdas de mais de 7% de sua economia, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) anunciou, na semana passada, que o Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil, índice que mede o desempenho econômico nacional, avançou apenas 1% em 2017.
Rejeitado por mais de 70% da população e praticamente sem nenhuma notícia positiva para comemorar, o governo de Michel Temer, e grande parte da mídia comercial, se apressaram para celebrar o que seria um resultado “extraordinário” e o fim da recessão. Para economistas ouvidos pelo Brasil de Fato, no entanto, por trás da propaganda, o país segue sem oferecer saídas consistentes para enfrentar o desemprego e o crescimento da miséria.
A própria elevação do PIB não foi obra da atual política econômica, explica Márcio Pochmann, professor do Instituto de Economia da Universidade de Campinas (Unicamp). “O resultado do PIB se deve ao desempenho do setor agropecuário, que cresceu 13% no ano passado, em decorrência de uma safra recorde de grãos. O setor industrial apresentou crescimento zero e o setor de serviços só cresceu 0,3%, uma estagnação. Ou seja, esse dado não está associado à política econômica do governo. Pelo contrário, a atual política econômica agravou o quadro do país nos últimos anos”, argumenta.
A recessão do país, que começou em 2015, poderia ter terminado no final de 2016, não fosse a mudança de governo provocada pelo impeachment da presidenta Dilma Rousseff. “A política do ‘austericídio’ começou ainda no governo Dilma, mas foi aprofundada com Temer, o que prolongou a recessão e contribuiu para uma falência generalizada das empresas. O único setor que obteve lucros foi o financeiro, ou seja, os bancos, que mantiveram seus ganhos. Em algum momento a gente ia bater no fundo do poço e uma recessão tão demorada ia dar um sinal de recuperação, mas trata-se de um crescimento marginal [esse do PIB]”, aponta o economista Paulo Kliass, doutor pela Universidade Paris 10 e especialista em políticas públicas e gestão governamental.
Desemprego
Na última atualização do IBGE, também da semana passada, o desemprego no país manteve patamares elevadíssimos. Um total de 12,7 milhões de pessoas estão sem trabalho no país, índice que representa 12,2% da chamada população economicamente ativa (PEA), aquela que busca trabalho e não encontra. O número é menor do que no ano passado, que chegou a registrar 14,1 milhões de desempregados, mas o que impulsionou a queda foram os empregos sem carteira assinada ou o chamado trabalho por conta própria. Pela primeira vez ao longo dos últimos anos, o Brasil voltou a ter mais empregos informais, de baixa qualidade e menores salários.
“O pouco crescimento do emprego vem se dando precariamente, na informalidade. É uma combinação da capacidade ociosa da indústria com a flexibilização da legislação trabalhista. É importante salientar que a média do salário informal é muito mais baixa do que de quem tem carteira assinada, além de serem trabalhos muito mais precários do ponto de vista da segurança e da assistência previdenciária, o que acaba prejudicando o próprio sistema previdenciário, já que nem empresas e trabalhador passam a contribuir com o INSS. Não é um processo sustentável para o país”, analisa Paulo Kliass.
Além dos mais de 12 milhões de desempregados, Márcio Pochmann lembra que um outro contingente muito expressivo, que engloba cerca de 4 milhões de trabalhadores, desaparece da estatística porque deixa de procurar emprego. “São pessoas que estão desempregadas há muito tempo e não conseguem arrumar uma ocupação, por isso deixam de procurar. O IBGE identifica como população economicamente inativa e, por isso, essas pessoas nem entram nas estatísticas”, explica
Problema estrutural
Os economistas ouvidos pela reportagem lembram que não houve ampliação da capacidade instalada do setor produtivo nos segmentos da indústria e dos serviços, ao longo dos últimos anos, o que revela o caráter ilusório de uma recuperação econômica mais consistente. “O Brasil tem uma economia com baixíssima capacidade de expansão, do ponto de vista da produção. Esse cenário que vem acompanhado do aumento dos importados, justamente porque qualquer ganho extra de renda não encontra capacidade produtiva para responder a demanda internamente”, avalia Márcio Pochmann.
Segundo Paulo Kliass, esse é um problema estrutural da economia brasileira. “Foi adotada uma opção de estimular a exportação de commodities agrícolas, petróleo e minérios, que são produtos de baixo valor agregado, ou seja, o país exporta basicamente a sua natureza. Por outro lado, foi feita uma política de valorização da importação de produtos industrializados, principalmente da China e de outros países asiáticos, o que provocou uma quebradeira da indústria brasileira de produtos manufaturados”, destaca.
Na origem do problema, a combinação de câmbio valorizado e altas taxas de juros, que desestimulam a capacidade produtiva da indústria nacional. “Esse movimento de desindustrialização foi ceifando a capacidade de produzir e fez com que os industriais preferissem ser meros montadores. Eles importam produtos manufaturados para montar aqui no país, sem transformação. O fato de nós vivermos com alta taxa de juros foi criando esse tipo de empresário que não tem retorno operacional e perde o estímulo da produção”, acrescenta Márcio Pochmann.
Para Kliass, o Brasil só poderá sair da crise “quando o Estado recuperar os investimentos na área social, de infraestrutura, mas o que o governo atual tem sinalizado é exatamente o oposto”, lamenta.
Pedro Rafael Vilela